sábado, 6 de setembro de 2014

O inebriante perfume do Livro


por Innocêncio Viégas




No momento discutimos quanto ao fim do livro de papel, tendo em vista o modismo do livro virtual nos mais diversos aparelhos da modernidade.
Para quem gosta de ler; que vai sempre que possível a uma livraria ou mesmo a um “sebo”; que olha aquela pilha de livros; que fica a admirar a encadernação, o colorido de suas capas, as “orelhas” e, mais que tudo, sente o perfume que vem do livro quando aberto perto do seu rosto; para esse leitor, o livro de papel nunca se acabará.
O cheiro do livro novo me fascina. Mas o livro usado tem para mim o mesmo cheiro da saudade dos bons tempos.
Dia desses, nas minhas intermináveis visitas aos “sebos”, encontrei uma preciosidade. Um livro de Affonso Arinos de Mello Franco, edição de 1985 com o prefácio de Alceu Amoroso Lima e contra capa de José Sarney, ainda com o cheiro da velha Europa, do Tejo, do Douro, e dos Mosteiros da vetusta Itália. O livro, meus amigos, está manchado em algumas páginas com pingos de vinho, e essas manchas têm o rubro da uva Isabel e o amarelo-ouro da Moscatel de Setúbal. Ele conserva até hoje em sua alma, o cheiro doce do vinho de Alentejo.
Procurei entre suas páginas, uma pista do seu primeiro dono e nada achei, além dos respingos perfumados e algumas anotações a lápis, em diversas páginas. Possivelmente, grifos de um velho mestre, preocupado em marcar os pontos preciosos da boa leitura.
Continuei lendo e imaginando a pessoa lendo e sorvendo gostosamente uma taça de um bom e perfumado vinho do Porto “Ramos Pinto” ou mesmo um “Brunello di Montalcino”.
Parei a leitura, fui à adega, na Biblioteca, peguei uma coleção de miniaturas dos bons vinhos do Porto que o mano Abdias trouxe de Portugal e, gentilmente me ofertou. Desisti de violar a coleção e fui direto ao robusto D. José, um saboroso Porto rubi. Acordei o dorminhoco, peguei uma taça colorida da Real Companhia Velha, despejei o precioso líquido e fiquei a admirar o aljôfar de suas borbulhas.
Fomos: eu, o livro, e o vinho, para o banco de pedra que fica no santo lugar à sombra do abacateiro, na Praça das Flores, aqui mesmo no quintal do Rancho.
O vinho foi pouco, pois estou limitado a uma simples taça, mas o livro foi um grande companheiro por umas duas horas, até a leitura ser interrompida, já à tardinha, pelo suave cantar do sabiá “colodiã”, que dorme no abacateiro, abacateiro que me empresta sua sombra, no final da tarde, antes que a noite venha. Ah! ia me esquecendo de lhes dizer o nome do livro: ‒ Amor a Roma. Este título é um palíndromo do saudoso Pedro Nava, isto é, pode ser lido ao contrário que dá no mesmo. Amor a Roma.
Um grande livro de um grande autor. São momentos iguais a estes que me deixam viver além das dores.
Depois de tudo isto, caros amigos, só resta gritar a todos os ventos: ‒­­ Ave César! Viva o vinho ... sem esquecer o inebriante perfume do livro.                     
Boa noite. Tenham todos, bons sonhos!        



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Innocêncio Viégas  é

*        Teólogo – Escritor
Membro das academias:
Acad. de Letras de Brasília
Acad. Maçônica de Letras do DF
Acad. Maçônica de Letras Paranaense
Acad. Maçônica de Letras e Artes do Brasil – GOB
Confraria dos Amigos da Boa Mesa – COMES
Academia Maçônica de Letras do Maranhão (correspondente)
Email – inocencio.viegas@gmail.com
 


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