por
Innocêncio Viégas
No momento discutimos quanto ao fim do livro de
papel, tendo em vista o modismo do livro virtual nos mais diversos aparelhos da
modernidade.
Para quem gosta de ler; que vai sempre que possível
a uma livraria ou mesmo a um “sebo”; que olha aquela pilha de livros; que fica
a admirar a encadernação, o colorido de suas capas, as “orelhas” e, mais que
tudo, sente o perfume que vem do livro quando aberto perto do seu rosto; para
esse leitor, o livro de papel nunca se acabará.
O cheiro do livro novo me fascina. Mas o livro
usado tem para mim o mesmo cheiro da saudade dos bons tempos.
Dia desses, nas minhas intermináveis visitas aos
“sebos”, encontrei uma preciosidade. Um livro de Affonso Arinos de Mello Franco,
edição de 1985 com o prefácio de Alceu Amoroso Lima e contra capa de José
Sarney, ainda com o cheiro da velha Europa, do Tejo, do Douro, e dos Mosteiros
da vetusta Itália. O livro, meus amigos, está manchado em algumas páginas com
pingos de vinho, e essas manchas têm o rubro da uva Isabel e o amarelo-ouro da
Moscatel de Setúbal. Ele conserva até hoje em sua alma, o cheiro doce do vinho
de Alentejo.
Procurei entre suas páginas, uma pista do seu
primeiro dono e nada achei, além dos respingos perfumados e algumas anotações a
lápis, em diversas páginas. Possivelmente, grifos de um velho mestre,
preocupado em marcar os pontos preciosos da boa leitura.
Continuei lendo e imaginando a pessoa lendo e
sorvendo gostosamente uma taça de um bom e perfumado vinho do Porto “Ramos
Pinto” ou mesmo um “Brunello di Montalcino”.
Parei a leitura, fui à adega, na Biblioteca, peguei
uma coleção de miniaturas dos bons vinhos do Porto que o mano Abdias trouxe de
Portugal e, gentilmente me ofertou. Desisti de violar a coleção e fui direto ao
robusto D. José, um saboroso Porto rubi. Acordei o dorminhoco, peguei uma taça
colorida da Real Companhia Velha, despejei o precioso líquido e fiquei a
admirar o aljôfar de suas borbulhas.
Fomos: eu, o livro, e o vinho, para o banco de
pedra que fica no santo lugar à sombra do abacateiro, na Praça das Flores, aqui
mesmo no quintal do Rancho.
O vinho foi pouco, pois estou limitado a uma
simples taça, mas o livro foi um grande companheiro por umas duas horas, até a
leitura ser interrompida, já à tardinha, pelo suave cantar do sabiá “colodiã”,
que dorme no abacateiro, abacateiro que me empresta sua sombra, no final da
tarde, antes que a noite venha. Ah! ia me esquecendo de lhes dizer o nome do
livro: ‒ Amor a Roma. Este título é um palíndromo do saudoso Pedro Nava, isto
é, pode ser lido ao contrário que dá no mesmo. Amor a Roma.
Um grande livro de um grande autor. São momentos
iguais a estes que me deixam viver além das dores.
Depois de tudo isto, caros amigos, só resta gritar
a todos os ventos: ‒ Ave César! Viva o vinho ... sem esquecer o inebriante
perfume do livro.
Boa noite. Tenham todos, bons sonhos!
---
Innocêncio
Viégas é
* Teólogo
– Escritor
Membro das
academias:
Acad. de Letras
de Brasília
Acad. Maçônica de
Letras do DF
Acad. Maçônica de
Letras Paranaense
Acad. Maçônica de
Letras e Artes do Brasil – GOB
Confraria dos
Amigos da Boa Mesa – COMES
Academia Maçônica
de Letras do Maranhão (correspondente)
Email – inocencio.viegas@gmail.com
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