ELOCUÇÃO POÉTICA DE RECEPÇÃO
A
MARCO COIATELLI
PELO ACADÊMICO
MURILO MOREIRA VERAS
De novo o
Parnaso é desperto,
não à evocação
do helênico braço de Leônidas
no desfiladeiro de Termópilas,
– a renhida batalha dos 300 heróis
espartanos –
mas em louvor à sábia Atena
ao som da lira lírica de Apolo.
Homero já transpôs as
intransponíveis muralhas
de Ílion,
vencida pelo Cavalo Armado dos Aqueus,
Aquiles quebrou o encanto do
invencível Heitor.
Chamas já devoram a cidadela do rei
Príamo.
‘Stamos em pleno mar e ondas
atávicas
se elevam aos umbrais místicos da
aventura.
Libertemo-nos todos das algemas da
inércia
e abram-se, doravante, os pórticos
deste Parnaso das Letras.
Eu me transformo em Virgílio
redivivo,
conduzirei em comédia edênica
o discípulo Marco Coiatelli, com
quem me identifico
– qual novo ressuscitado Dante.
Renovemos, pois, nosso Panteon
Brasílico
e saudemos o novel acólito
que nos honra com seu lírico cabedal,
a literatura a correr-lhe nas
veias
em profusão de sonhos.
Como teu Mestre – nesta hora
máxima –
ponho-me a guiar-te os passos
pelos escaninhos argênteos dessas
veredas,
se não são as do Grande Sertão
iluminado,
são fluídos fúlgidos de
eloquência,
mercê dos retóricos condiscípulos
que por estas letras trilham.
Orienta-nos nesta empresa,
gentil-homem,
de profícuas e gentílicas
evocações,
nobre centurião literário cujas
diretrizes
nossa Academia segue,
ele, poeta e prosador de grande mérito,
porta-voz da Capital da Esperança.
Outros integram esta Távola de
Escribas,
são corifeus de muitas luzes e
feitos,
homens de letras e magistérios,
poetas de estação,
dignatários das mais límpidas estirpes,
laboriosos cantantes,
a semear este campo ínclito,
feito de letras e sonhos.
Um poeta evadiu-se de repente do
Olympo
das liras,
e cultiva essas nossas terras
insones,
povoando-as de astros, pérolas e míticas
estrelas,
artífice às asperezas do sertão
cearense,
para além do azul daquelas serras
onde nasceu Iracema
– Serra Azul, o poeta.
E outros mais novos se fazem
presentes,
veros intérpretes de horizontes,
lusófonos, com o luzir límpido
de seus ofícios,
peritos da alma, luminares psicólogos,
que se descobrem também poeticistas.
Eis que em nosso templo agora
ingressa
uma Cecília Meireles rediviva,
à leitura solidária afeita,
flor das minas jornalísticas.
Preclaros Acadêmicos.
É a Arcádia radiante e radiosa que
ascende,
à busca de lúcidos olhares
a justificar nosso existir
planaltino.
Apressa-te, pois, ensarilha as
armas
de teus mais belos sonhos,
os quais, sabemo-los, são expectantes
como as rútilas estrelas.
Afinal, ó forasteiro das letras amanhecidas,
onde nascestes e o que trazes de
opções
nos teus alforjes?
Acaso o caleidoscópio de teus
fazeres nos arrebata?
Quais as tuas ousadas oferendas?
Qual o teu campo de ação para que
este humilde mestre
te conduza ao Pórtico Acadêmico?
No auge do helênico porte, tu me respondes:
“Nasci nas plagas da Maravilhosa Cidade,
o abraço fraterno do Corcovado recebi,
em seus eflúvios benfazejos me refugio,
insone de luz e de esperança.
Sou um fugitivo, um viandante, formado
nas trilhas de Emaús, se aprendiz de monge fui
no Mosteiro de São Bento,
ali, me tornei discípulo da verdade,
aprendi a brandir as brancas armas do saber
e com elas o artifício de viver.”
É assim com esse dizer honesto e
simples
que o apóstolo ora se apresenta,
um sorriso a iluminar-lhe a pupila
interrogante.
“Minhas dádivas – diz ele –
são os livros
que escrevi e escrevo, narrativas infantis,
estórias do hoje e do amanhã.”
Timoneiros Acadêmicos.
Este é o Marco Coiatelli
– o mais novo discípulo de Emaús,
escriba da literatura.
Coiatelli escreve livros infantis
ou
para adultos da infância?
Novel Saint-Exupéry renascendo
brasileiro?
Longe foi nosso viandante
literário,
Emaús propiciou-lhe o ensejo de se
abeberar,
nos maiores clássicos da
literatura
infantil.
Refugia-se em Esopo e bebe no
córrego
de seu afluente francês,
La Fontaine sempre renovado
e a mitologia de suas encantadoras
estórias,
extraídas do velho sábio grego.
E por que não também em Monteiro
Lobato?
As peripécias de Emília e as
prosopopeias
do Visconde de Sabugosa não estão
escondidas
em balões coloridos e nas
quixotescas façanhas
do Jabuti & da Tartaruga, em
Coiatelli?
Mas Coiatelli não é La Fontaine
nem Monteiro Lobato
e ele começa assim a história de
“Jabuti e Tartaruga”:
“... Era um reino muito, muito antigo, onde viviam
um rei e uma rainha, já bem velhinhos.
Durante toda a vida dos dois naquele reino
maravilhoso, rei e rainha tiveram de tudo,
t-u-d-o, tudinho mesmo o que queriam.
De sorvete a avião, de balinha a carrão,
bastava pensar em algo e acreditar
que a coisa aparecia...”
É conhecido o começo do “Pequeno
Príncipe”:
“Quando eu tinha seis anos, vi uma vez
uma magnífica figura num livro
sobre
florestas virgens, chamado
“Histórias Verdadeiras”.
Representava uma serpente engolindo uma
lebre.”
Em Coiatelli, o rei e a rainha
tinham
um Jabuti e uma Tartaruga.
O Jabuti era muito perguntador,
“questionava tudo, de frente para trás,
de trás para frente e vice-versa.”
Em Saint-Exupéry o personagem
perguntador
desenha um chapéu, mostra a um
adulto
e lhe pergunta se a figura não lhe
dá medo.
O adulto então responde:
“Por que ter medo de um simples chapéu?”
E o pequeno sábio retruca:
– Acontece que não desenhei um chapéu,
mas uma jiboia que engoliu um elefante.
O Jabuti de Coiatelli também sabe
ser irônico,
era um perguntador militante.
A Tartaruga, não “... era mais velha, mais sábia,
gostava muito de ler, de cabeça para baixo,
estudar de lado e explicar em toda direção.
Pensava muito e era, dos dois, a voz da razão.”
E era assim “os únicos capazes de alegrar
rei e rainha naqueles dias entristecidos.”
Esopo, La Fontaine, os Irmãos
Grimm ou Saint-Exupéry?
Vo-los direi que Coiatelli se inspirou
em todos,
mas abrasileirou seus personagens.
profetizou os sonhos de nossos
infantes.
“Julia e os Balões” começa assim:
“Julia adorava fazer balões de papel. Tinha grandão,
do tamanho de um avião e pequenininho,
do tamanho de um dedinho.”
Balões de fantasia ou fantasia de
balões?
Balões e mais balões, somente de
sonhos,
balões de fogo dos adultos
são balões assassinos, produzem
incêndios
e destroem as cidades – o autor
exorciza.
Todas as crianças já sabem e a
Julia de Coiatelli
também.
Nobres Polígrafos.
Essas invenções – sonhos lúdicos
ou lúcidas esperanças – foram
escritas
para crianças
ou para nós mesmos, transformados em crianças?
E nosso ousado viandante lírico de
Emaús
nos interroga a nós, baloeiros da
razão,
ontologicamente:
“Vocês são felizes vivendo assim?
– perguntou Julia.
– Somos muito felizes com as surpresas da vida,
e, enquanto não partimos, brincamos de
tornar alguém mais feliz.”
Pois enquanto nosso homem de Emaús
surpreende com seus brinquedos de
sonhos,
ele também brinca pela vida afora
com sonhos verdadeiros,
semeia trabalhos, polígrafo e poliglota que é,
de mil feitos e outras mil artes.
Pertence à Confraria de
Bibliófilos do Brasil,
polvilha a internet com pílulas
alegres de otimismo,
colabora em planos e programação de museus:
Marco Coiatelli é um seven-trompet-man,
novel Marco Polo,
maravilhas desvendando,
por estrangeiras plagas ele
navega.
montado no quixotesco Rossinante
de sua fé.
Patriota, sem ignaros ufanismos,
nosso fiandeiro de ideias
os nossos clássicos modernos também
aclama
– Lêdo Ivo um dos favoritos.
Ouçamos de Lêdo Ivo este poema:
Dai-me o silêncio das pedras
que caminham no horizonte
e a claridade das águas
que jorram das fontes.
à noite é sombra.
Uma estrela atenta
lava as manchas do meu sono.
Só os instantes perduram
no dia puro e perdido.
São ninhos que guardam sonhos
Ilumino a escuridão.
Vejo as sílabas da noite
espalhadas pelo chão.”
É hora de cerrar a cortina deste
Alquímico Teatro.
Falamos de boabás, rosas falantes,
estrelas sorridentes
balões coloridos e um mundo de outros
heróis em ação.
Mas, aqui, no palco de nossas
vidas
adultas,
em meio a sérios e tão renomados
Acadêmicos,
nosso mágico Coiatelli
não nos brinda com Pequenos
Príncipes,
bonecas falantes, encantados
reinos,
ele nos oferece sonhos, fantásticos sonhos,
os quais construiu com o realismo
de seus próprios sonhos
de criança em ação.
Corifeus das Letras.
Ouvi-me – que já se delonga o
Canto.
Alcemo-nos aos degraus deste nobre
Conciliábulo.
Minha missão ora se cumpre.
O meu pupilo de meu auxílio se
desprende,
pois ascende aos áureos pórticos,
sob o olhar de uma Beatriz
rediviva,
que o transportará, qual humílimo
Dante,
ao Paraíso.
Ali, nesse Cenáculo de ideias se imortalizará,
não mais como matéria em si,
sempre ignara e bruta,
mas espiritualizado à contemplação
do Bem
em direção da inefabilidade da Luz.
Neste átimo de enlevo, recorro a
Dante,
em seu lídimo verso:
“...A prima Luz, que neles todos raia,
de tão variado modo se recebe
quão vários os Fulgores em que caia.”
... E cesse tudo que a ACLEB hoje aventa,
Que Marco Coiatelli nela adentra.”
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